quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Frágeis Existências 2°Capítulo.

Se uma seca persistente e contos de fadas esvaziaram as cinco cidades houveram incrédulos espoliadores arranjados em caravanas vasculhando cada casa, ou estrutura pública em busca de metais e rezes esquecidas ou deixadas pela pressa; e com um número de valores encontrados muito baixos para um esforço de uma caminhada de quarenta e três dias da mais próxima cidade, trilhas e estradas foram sendo engolidas pela vegetação e esquecidas por ambição frustrada.
-Ainda deve se encontrar prata nos nichos, os Ghatarin eram muito religiosos!
-Nokal disse que varreram todos os espaços, e tudo que encontraram foram alguns cães magros, dos quais deram um fim por pura piedade.
-Acredito agora que aquela cidade abrigava fantasmas à tempos, e o que se deu por último foi a diáspora daqueles que desistiram de suas vidas por conversa fiada!
-Mudeb cometeu sacrilégio urinando nos pés do totem de Pedil, disse ser uma oferenda pelas terras secas daquele lugar; nós nos rimos das afrontas inventadas por outros da caravana, mas minha memória me pregou uma peça agora me escondendo as lembranças do que me contou.
-Cuidado, os deuses podem se vingar- Provocou Laim já com um riso solto nos lábios.
-Deuses que lançam sortilégios e não impedem misérias nem são dignos de menção, e eu os vejo sendo apagados das mentes dos cultua dores logo que outra praga se abata sobre tais tolos!
 Os pés, animados pelas conversas afastavam a lama enquanto enxadas recortavam a terra, e de tempos em tempos os trabalhadores molhavam as vestes para aliviar o calor.
-Olhem!Nuvens pesadas pairam sobre as matas de Tusseq!
-Logo nos alcançará a chuvarada, e talvez nos voltem os vizinhos e suas belas filhas!- Houveram abraços de congratulação e alívio pela previsão do fim da carestia, e novas anedotas foram contadas em afronta à memória dos deuses.
O dia de serviço foi encerrado pela euforia daquela espera, e cada qual se abrigou em sua casa e se postou às janelas  sentindo as carícias agressivas do vento forte, mas uns poucos  imprudentes corriam com o peito nu chamando chuva.
-Sai daí Hotai! Não vês que vai se molhar?-Gritou a adolescente ao amigo que cambaleava entre as árvores.
-Não! Hoje me molho nesta chuva, e recomendo que vista algum trapo velho e me acompanhe nesta alegria!
-Nem pense nisto, minha mãe me rasgaria os lombos no látego!-E ela riu tão alto quanto lhes permitiam os pulmões.
Trovoadas e relâmpagos não demoraram em acompanhar a ventania, um leve temor fechou não poucas janelas; e fora das casas os cães se agitavam em uivos e ganidos angustiados.
-Cale-se Aufed!São os sons da mais bendita chuva!-Ralhou uma velha de cor, mas nem este, ou outro qualquer se recolheu às suas casinhas, e os urros aumentados passaram a ser incomodo e irritação aos seus donos.
As horas e expectativa aguçaram os ouvidos, e pelas frestas das construções eles viram nuvens negras navegarem baixas o céu, e muitos raios estalavam próximos e perigosos e já não havia quem desafiasse os poderes climáticos.
A noite adensou ainda a ventania trazendo um ar sufocante e no horizonte trevoso começou a se erguer uma luminosidade rubra, provavelmente filha das descargas circundantes, e o brilho crescia devorando as securas orgânicas da paisagem, e os confinados torciam por uma precipitação volumosa para lhes salvar os campos.
Era um cenário vermelho e negro, inquieto pelas movimentações invisíveis que lançavam-lhes poeira e fumaça, e o medo velado de forças sinistras os guardaram seguros em suas casas até o brilhar do dia seguinte.
A porta de Dreh-Moga foi açoitada oito vezes antes que atendesse; demorara não por sono ou preguiça, mas por se encontrar despido e certo de que a queima havia alcançado os campos de seu contratante; o que lhe garantia uma satisfação vingativa e alguns dias de folga.
-Quem me incomoda?
-Está atrasado para o serviço, vim aqui o escoltar ou convencer a cumprir suas obrigações.
-Me encontro enfermo, por isso não compareci nos campos férteis.
-Deixa me ver-te a aparência para que me convença de sua enfermidade!
-É contagioso!
-Não te creio, canalha!-O pé explodiu na porta frágil, e o sangue fugiu das faces do ameaçado.
Sua mão parecia ter ao menos oito dedos, e eles comprimiram o pescoço até que as lágrimas não puderam ser contidas; então o jogou como um boneco de pano no chão batido da sala; e ao recobrar o alento ousou se erguer sobre seus pés, mas o punho forte o curvou com um soco no estômago.
-Cof!Cof!Cof! Para de bater que vou! Por favor!
-O dinheiro do arrendamento pago aos anciões deve ser recobrado, e o lucro parece agora muito distante naquelas terras consumidas de fogo.
-Com certeza os anciões devolverão o dinheiro ao chefe Pudup; ou o prejuízo o levará a vender outra filha à escravidão para se recobrar...
-Não me interessam seus discursos, só vim o animar à trabalhar, vista suas camisas apanhe suas ferramentas; não o esperarei, pois tenho que despertar outros espertinhos!
Quando Dre-Moga se aproximou de seu lote de trabalho três dos outros empregados debruçavam-se sobre um corpo enegrecido de fuligem; um descarnava entregava-o ao outro para a salga, último separava outras carcaças úteis.
-Este não serve!-O sangue havia se coagulado em um tom muito escuro, e a carne fora quase de toda consumida.
-Veja!Parece que Dreh finalmente recebeu o salário de sua vadiagem!-As mãos correram às bocas tentando calar a gargalhada, mas a satisfação de ver aquela cara, que era quase sempre deboche,agora transtornada não pedia discrição alguma.
-Queria os lembrar que esta tempestade dobrou-lhes o trabalho, mas não o pecúnio!-Piscou um olho e desceu das costas a enxada de cobre já se defendendo de mais uma possível agressão, mas esta não veio. Eles esperariam outra forra do destino por mais este seu orgulho enquanto se deliciavam com os grandes hematomas tão à vista nos olhos e bochechas do inimigo.
O dia cheirava à queimado, e Podub só achou aquele recalcitrante no seu declinar. Ele se aproximou do monte de terra da vala sanitária e vinte metros antes já cuspia seus insultos como de costume.
Dre-Moga não prestou atenção no discurso, só se desculpou meio desanimado por sua farsa e preguiça e jurou ser mais cuidadoso com horários e dias úteis.
O homem alto e encurvado, com cabelos ensebados de aloe e roupas extravagantes falou por intermináveis nove minutos e se foi sem que Dreh tivesse idéia do resultado do monólogo e quando resolveu terminar o expediente furtou alguns filés de lebre e se foi para ao menos um jantar decente.
-Espero que esta sociedade miserável desapareça com sua avareza e ganância. -Olhou para a banda leste e um arrepio lhe eriçou os pelos da nuca.

Continua...
Anderson Dias Cardoso.

3 comentários:

raylsonbruno disse...

Realmente difícil escrever por capítulos. Dar início, meio efim em um texto e mesmo assim não acabá-lo... Um grande desafio que vc aceitou de bom grado e vem se saindo muito bem em sua jornada! ;)

Vampira Dea disse...

Nossa isso dá roteiro de filme , menino. Beijo pra ôce

Célia Ramos disse...

Muito bom...um livro está se pondo à vida! basta publicar...volto depois pra ler mais um capítulo! abraço!

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