domingo, 16 de agosto de 2015

Como Dizia o Tio Ben...



O último quadro que se recordava da situação era o pintado com gritos e desaforos, pelo troco errado passado por aquele jovem caixa. Foram, lhe parecia, por conta de uns malditos cinco centavos, e o garoto quase se encolhia atrás do balcão, tamanha vergonha. Na verdade, não se sentiu mal, e achava que aquilo tudo fora merecido, mas, não sabia se por conta da sorte, notou que ambos eram filmados. Era preciso contornar a situação.
-Sabe quem eu sou, Sr... Algélio?
-Sim, senhor.
-Sabe que sou uma das pessoas mais ricas do Estado, correto?
-Sim, senhor.
-Então... Sei que fui meio indelicado contigo, e proponho uma brincadeira, para descontrair, e te compensar pelos meus exageros.Concorda?
-O que o senhor quiser.
-Eu tenho em meu bolso um objeto e, caso o senhor me descubra o que é te dou aquele carro que está lá fora.
-Mas, senhor... é muito...
-Eu sei que deve estar pensando que estou só brincando com sua cara – disse já depositando as chaves sobre o balcão – Aqui estão. São suas, caso consiga.
O garoto hesitou um pouco, fechou os olhos, mordeu o lábio inferior, e sussurrou algo inaudível.
-Não entendi, meu filho. Poderia repetir. Desafiou o debochado figurão.
-Disse que há um maço de cigarros, mais propriamente, um Marlboro, em seu bolso – a voz agora era firme, e o homem gargalhava a perder o fôlego.
-Muito bom!Muito bom, meu caro!Mas, como acredito que tenha notado, eu entrei aqui com minha carteira em mãos. Eu não tenho um bolso sequer em toda minha vestimenta; e além do mais, eu nem fumo!
-O senhor poderia tentar seu lado esquerdo, na parte da frente? – insistiu o rapaz, e o homem o fez; sacando da calça cara o objeto predito.
-Meu Deus! – As mãos trêmulas, e os olhos vidrados examinavam assustados aquele pequeno volume.
-Nunca subestime os garotos que trabalham à noite, em humildes conveniências, e quanto ao seu carro, fique com ele. – bradou a boca espumante do mancebo, enquanto se vaporizava e sumia diante dos olhos do poderoso homem.
Passos meio vacilantes, e o estado era de uma semi catatonia.O pé direito tocou o macio carpete de seu importado, quando ouviu ao longe uma voz insistente, que acompanhava um vulto. Quando este se pôs bem às vistas, notou o moço de uniforme suado, e respiração ofegante.
-Senhor, são R$ 19,85 pelo seu consumo.
-Mas... O que aconteceu com você?
-O que não era para ter acontecido... - choramingou o balconista.
O homem abriu a carteira, lhe entregando uma nota de cem, insistindo que ficasse com o troco.
Era melhor guardar sua curiosidade para coisas mais racionais.



Anderson Dias Cardoso.

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